A era glacial das emoções

O isolamento dos corações humanos na sociedade atual

Um ombro amigo. Ombro, colo, aconchego… Algo tão “cobiçado”! Cada vez mais esquecido…

Ah! Se todos soubessem dar valor ao ombro de um verdadeiro amigo. Alento de todas as horas. Desde os momentos de desilusão às explosões de alegria. Ah! Se enxergassem o tesouro que é poder abaixar a cabeça na certeza de um carinho. Mas parece que o ritmo alucinante da vida moderna vem, gradativamente, distanciando os corações humanos.

A verdade é que muita gente parece ter receio de viver a vida, muitas vezes, por ter vergonha ou, talvez, medo de ser feliz. Uma vergonha inconfessa, um medo de conturbadas origens. A vergonha talvez se deva, em parte, ao fato de algumas pessoas acharem ridículo demonstrar muitos de seus sentimentos, dizendo que isso não passa de “sentimentalismo barato”. No que diz respeito ao medo, uma das principais origens é, sem dúvida, a possibilidade de desilusões. No entanto, fugir dos problemas nunca foi a melhor solução para resolvê-los e é provável que quem se feche numa redoma de vidro na tentativa de conduzir a vida sem traumas seja também aquele que mais os atraia.

Talvez, se ao menos uma parte da humanidade soubesse chorar nos momentos tristes e sorrir abertamente nos alegres, procurando sempre expressar suas emoções de um modo geral, já seria um grande passo para que pudéssemos voltar aos tempos áureos das emoções, quando um sincero sorriso realmente falava mais do que mil palavras… Drummond diria: “Não nos afastemos.” E nessa caminhada em certos momentos não é preciso mesmo palavras… Sim, um abraço com aquele tapinha despretensioso e regado a companheirismo, um beijo no rosto sem máscaras, um aperto de mão realmente satisfeito, um simples aceno afetuoso, ou tão puramente um olhar cúmplice: são todos gestos capazes de falar sem palavras,visto que fazem parte de uma área tantas vezes indecifrável aos olhos da razão e somente capaz de ser compreendida pelos corações humanos. Corações que se resolvessem usar palavras para se expressar, provavelmente, gritariam bem alto que já estão cheios de viverem isolados, vendo que seus donos não conseguem se habituar a uma atitude que talvez trouxesse maior conforto às suas vidas: olhar nos olhos daqueles em quem se confia (confiar ao menos em alguém) e procurar dizer, sinceramente, o que se encontra escondido bem no fundo do peito.

É triste ter que admitir, mas a evolução tecnológica ocorrida de uns tempos para cá e, em particular, o desenfreado avanço dos meios de comunicação de longa distância, ainda que em muitos casos tenham vindo ajudar na manutenção de amizades, têm contribuído também, paradoxalmente, para “congelar”, ainda mais, as relações “olho no olho”. O que dizer de pessoas que trabalham em escritórios vizinhos ou ainda que moram na mesma rua e passam meses só se comunicando pelo computador? A questão é que algumas pessoas parecem ter literalmente se acomodado com a internet, limitando-se à facilidade de se comunicar com o mundo quase que exclusivamente por esse meio. Facilidade que tem seu preço. Não é difícil verificar o equívoco: por mais que alguns digam o contrário, o ser humano tem necessidades reais de afeto não capazes de ser totalmente atendidas por um mundo virtual marcado pela inconstância. O resultado é não raro a depressão, tão presente na sociedade atual.

E o que estamos esperando para começar a mudar isso?! Uma mudança interna, pois só assim se fará valer. A evolução tecnológica é um processo irreversível, mas não é só ela a culpada pelo visível “resfriamento das emoções”. Culpado mesmo é quem permanece inerte, achando tudo isso muito normal. O urgente é uma mudança de mentalidade que, por depender única e exclusivamente de nós, não pode ser considerada impossível.

O rumo que a humanidade vai tomar só o tempo poderá dizer, mas com tanta coisa amarga que somos obrigados a engolir não custa buscar um conforto mantendo a doce ilusão de um mundo que descongele a troca de olhares. E até lá, completaria o tímido poeta de Itabira, “vamos de mãos dadas”.

Ana Helena Ribeiro Tavares,

31 de maio de 2008

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Pássaro de Marfim

– Para o povo maravilhoso que faz dessa cidade verdadeiramente maravilhosa.

Absoluto sobre a Guanabara, paira um pássaro de marfim. Uma majestosa imagem de feições e nome santos – nosso Cristo Redentor.

O extremo privilégio de sua localização brinda quem o visita com a vista de todas as demais maravilhas do Rio. Do alto do Corcovado, vê-se a exuberância do Pão de Açúcar, a imponência do Maracanã, os belos contornos da Praia de Ipanema, a elegância da Lagoa e a imensidão das águas da Guanabara. Brilho aos olhos, sorriso aos lábios – esses são os presentes do Cristo a quem dele observa o esplendor da cidade postada aos seus pés.

Assim como dele ver a cidade é um encanto, de vários pontos do Rio é fácil vê-lo e se encantar. Braços abertos como asas, ele parece voar por cada canto de sua maravilhosa cidade. Andando pelas ruas do Rio, se olharmos com carinho para o céu, algo surgirá no horizonte… talvez um pássaro de marfim, que nos acompanha e nos protege, voando sem sair do lugar para que por ele nos sintamos abraçados.

Entre todos os que no Rio vivem, todos que por ele passam, cariocas de nascimento ou de coração, não há quem consiga ser indiferente à magnitude de sua beleza. Quem nunca o viu de perto sonha com isso, quem já viu não esquece a indescritível sensação de liberdade.

Alma dessa terra, imaginá-la sem o Cristo seria tirar-lhe a identidade. Pensar em Rio de Janeiro é pensar em Cristo Redentor. Chegar ao Rio é querer avistá-lo para, aí sim, saber-se nos braços da cidade.

Ana Helena Ribeiro Tavares,
07 de Novembro de 2002

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